Layoff Simplificado?

By Terça, 14 de Abril de 2020 Abril 26th, 2020 Covid 19, Direito Português, Direito Societário e Laboral

No passado dia 15 de março, foi publicada a Portaria n.º 71-A/2020 de 15 de março que define e regulamenta os termos e as condições de atribuição dos apoios imediatos de caráter extraordinário, temporário e transitório, destinados aos trabalhadores e empregadores afetados pelo surto do vírus COVID-19, tendo em vista a manutenção dos postos de trabalho e mitigar situações de crise empresarial. A mesma portaria veio a sofrer, três dias depois, alterações introduzidas pela Portaria n.º 76-B/2020 de 18 de março.

Desde logo, foi apresentado como um instrumento que consagrava um layoff simplificado. Isto é, um instituto jurídico com as características base do já disposto nos artigos 298.º a 308.º do Código do Trabalho, mas que dele se afastava por dois motivos: a simplificação dos procedimentos atinentes à sua ativação e o facto de se aplicar apenas aos casos de redução do período normal de trabalho dos trabalhadores (deixando de fora as situações de suspensão do contrato de trabalho, por encerramento da empresa ou ausência de trabalho).

Desde logo surgiram as mais diversas dúvidas e inquietações por parte dos profissionais jurídicos e de contabilidade, bem como dos próprios empresários. Assim, por facilidade de exposição, procuraremos percorrer o regime através das questões mais frequentes.

Quais os apoios previstos?

a) O apoio extraordinário à manutenção de contrato de trabalho em situação de crise empresarial, com ou sem formação. Este apoio concretiza-se no apoio por parte da Segurança Social no pagamento de dois terços da remuneração do trabalhador em 70% (cabendo ao empregador o pagamento dos restantes 30%). Esta remuneração corresponde ao rendimento que o trabalhador perderia em virtude do número de horas que deixa agora de trabalhar em virtude da situação de crise empresarial, com limite mínimo num salário mínimo nacional e limite máximo de três salários mínimos nacionais.
Este apoio pode ainda ser prorrogados por um prazo de 6 meses.

b) O plano extraordinário de formação;

c) O incentivo financeiro extraordinário para apoio à normalização da atividade da empresa. Este apoio encontra-se previsto para o período pós-layoff e é concedido pelo IEFP, I.P., mediante a apresentação dos documentos contabilísticos que comprovam a situação de crise empresarial e tem o valor de um salário mínimo nacional por trabalhador.

d) A isenção temporária do pagamento de contribuições para a Segurança Social, a cargo da entidade empregadora, durante o período de layoff, relativamente aos trabalhadores abrangidos pela medida e aos membros dos órgãos estatutários.

Quais as situações de crise empresarial?

a) A paragem total da atividade da empresa ou estabelecimento que resulte da interrupção das cadeias de abastecimento globais, da suspensão ou cancelamento de encomendas. Parece-nos que aqui se incluem não só as situações de cancelamento ou inexistência de fornecimento de bens ou serviços à empresa que se encontra em crise empresarial (os fornecedores das empresas quebrarem o seu abastecimento), mas também as situações de ausência de clientes ou cancelamentos de encomendas à empresa em crise empresarial.

b) A quebra abrupta e acentuada de, pelo menos, 40 % da faturação, com referência ao período homólogo de 60 dias, ou, para quem tenha iniciado a atividade há menos de 12 meses, à média desse período.

Tenho uma empresa constituída por uma fábrica e um escritório fisicamente independentes entre si. A fábrica encontra-se em situação de crise empresarial, mas o escritório continua a laborar. Posso recorrer a este layoff apenas para os trabalhadores da fábrica?

O art.º 3.º, n.º 1, al. a) da Portaria n.º 71-A/2020 de 15 de março prevê as situações em que apenas o estabelecimento se encontra em situação de crise empresarial, pelo que é possível nesta situação recorrer ao layoff.

Quais os documentos necessários ao pedido de layoff?

  • Formulário próprio (a ser disponibilizado até ao final do presente mês);
  • Declaração do empregador em como cumpre os requisitos para acesso aos apoios;
  • Certidão do contabilista certificado da empresa, atestando a situação de crise empresarial;
  • Listagem nominativa dos trabalhadores abrangidos e respetivo número de segurança social;
  • Comunicação escrita aos trabalhadores com a decisão de requerer o apoio extraordinário à manutenção dos postos de trabalho, indicando a duração previsível, ouvidos os delegados sindicais e comissões de trabalhadores quando existam.

Porém, o diploma prevê ainda a possibilidade de fiscalização das empresas que requeiram este apoio, podendo ser pedidos os seguintes elementos:

  • Balancete contabilístico referente ao mês do apoio bem como do respetivo mês homólogo;
  • Declaração de Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA) referente ao mês do apoio bem como dos dois meses imediatamente anteriores, ou a declaração referente ao último trimestre de 2019 e o primeiro de 2020, conforme a requerente se encontre no regime de IVA mensal ou trimestral respetivamente, que evidenciem a intermitência ou interrupção das cadeias de abastecimento ou a suspensão ou cancelamento de encomendas; e
  • Outros elementos ainda a ser aprovados por portaria do Governo.

Outras condições de acesso

No momento do pedido de apoio, a empresa deverá ter a sua situação contributiva perante a Autoridade Tributária e Segurança Social regularizada.

Tenho os meus trabalhadores em teletrabalho. Posso beneficiar do layoff?

Não. A não ser que se verifiquem o requisito de crise empresarial de redução de pelo menos 40% da faturação, não é possível aceder pois considera-se o teletrabalho como prestação efetiva de trabalho e, por isso, decisiva para a faturação.

Os gerentes e administradores beneficiam deste apoio ao layoff?

Não.

O que implica a perda do apoio neste layoff?

Para que possa manter estes apoios, a empresa não poderá:

  • Proceder a despedimento (exceto se por causa imputável ao trabalhador);
  • Não cumprir com o pagamento pontual dos vencimentos aos trabalhadores
  • Distribuir lucros;
  • Não cumprir com obrigações legais, fiscais e contributivas;
  • Incumprimento, imputável ao empregador, das obrigações assumidas, nos prazos estabelecidos;
  • Prestar de falsas declarações.

Qual a situação atual?

Para além de se aguardar a disponibilização do formulário por parte da Segurança Social e de muitas das empresas apenas conseguirem cumprir os requisitos de crise empresarial a partir de abril, foi já referido pelo Primeiro Ministro que a presente portaria será novamente objeto de revisão, abrangendo igualmente as empresas que, por determinação do Governo em execução do Decreto Presidencial do estado de emergência, foram forçadas a encerrar.

Da mesma forma, foi igualmente noticiado que a alteração referida irá abranger igualmente as situações de suspensão dos contratos de trabalho, para além das situações de mera redução do período normal de trabalho.

Sem prejuízo de vivermos tempos de absoluta excecionalidade e de este regime sofrer de uma volatilidade também ela excecional, verdade é que o layoff apresentado veio tudo menos “simplificar” a vida a profissionais e empresários. Da mesma forma, o leque de questões e dúvidas levantado por esta sucessão de diplomas é vasto e de difícil tratamento, dada a ainda ausência de casos concretos analisados pelos serviços da Segurança Social ou pelos Tribunais.

Resta-nos aguardar a consolidação das regras ora disponíveis para se poderem iniciar procedimentos.