Últimas alterações legislativas no Regime Jurídico de Entrada, Permanência, Saída e Afastamento de cidadãos estrangeiros de território nacional.

By Domingo, 26 de Abril de 2020 Direito Internacional, Vistos e Residências

Podem resumir-se as alterações legislativas no quadro do direito dos estrangeiros e da sua permanência em território nacional pelas seguintes inovações:

– Lei n.º 102/2017, de 28 de agosto, que procedeu à quinta alteração à Lei n.º 23/2007, de 4 de julho;

– Decreto Regulamentar nº 9/2018, de 11 de setembro, que altera a regulamentação do regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de cidadãos estrangeiros do território nacional.

– Lei 28/2019, de 29 de março, que veio estabelecer uma presunção de entrada legal na concessão de autorização de residência para o exercício de atividade profissional.

Antes de nos debruçarmos no conteúdo deste Decreto Regulamentar 9/2018, de 11 de setembro, e à última alteração legislativa de 2019 vejamos, quais foram, no essencial, as alterações operadas à Lei dos Estrangeiros que entrou em vigor em 27 de novembro de 2017.

Lei n.º 102/2017, de 28 de agosto, que procedeu à quinta alteração à Lei n.º 23/2007, de 4 de julho:

Esta alteração representou a quinta alteração legislativa à designada Lei de Estrangeiros e transpôs para a esfera portuguesa três atos legislativos da União Europeia, mais precisamente a Diretiva 2014/36/UE (26/02/2014) relativa às condições de entrada e de permanência de nacionais de países terceiros para efeitos de trabalho sazonal, a Diretiva 2014/66/UE (15/05/2014), relativa às condições de entrada e permanência de nacionais de países terceiros no quadro da transferências dentro das empresas , e a Diretiva 2016/801/UE relativa às condições de entrada e permanência de cidadãos nacionais de estados terceiros para efeitos de investigação, de estudos, de formação, de voluntariado, de programas de intercâmbio de estudantes, de projetos educativos e de colocação au pair.

Mas não só;

A lei também foi alterada no sentido de atrair empreendedores, investidores e cidadãos ligados ao estudo e à pesquisa, bem como no sentido da regularização de cidadãos trabalhadores em Portugal que permaneciam irregulares no país, sem qualquer perspetiva de virem a obter um título de residência em Portugal, mas contribuindo para o tecido económico português e sendo contribuintes do nosso país.

A alteração legislativa veio assim prever uma nova modalidade de obtenção do chamado Visto Gold/Golden Visa, ou seja, a autorização de residência para atividade de investimento (ARI) e instituiu igualmente novas hipóteses de concessão de autorizações residência com dispensa de visto.

Desde logo fê-lo com a alteração e a introdução no artigo 3º de diversas definições. De entre os 220 artigos que compõem a Lei de Estrangeiros o artigo 3º é dos mais relevantes, uma vez que encerra a definição de conceitos que encerram o corpo legal e regulamentar.

O conceito de atividade altamente qualificada (artigo 1º, nº 1 al. a), deixa de indicar apenas a atividade exercida perante o ensino superior, mas passando a comportar aquelas atividades cujo exercício requeira competências técnicas especializadas, de carácter excecional ou qualificação adequada para o exercício.

Quanto às atividades de investimento desenvolvidas em Portugal, por um período mínimo de cinco anos altera-se uma disposição legal e introduz-se outra, resultando em duas novas modalidades de concessão do Golden Visa:

a modalidade de transferência de 500 mil euros para a aquisição de unidades de participação em fundos de investimento ou de capital de risco; Com a nova lei o valor foi reduzido para 350 mil euros mas, os fundos de investimento ou de capital de risco deverão estar vocacionados para a capitalização de empresas, constituídos ao abrigo da legislação portuguesa e que apresentem maturidade de pelo menos cinco anos e em que 60% dos investimentos estejam concretizados em sociedades comerciais sediadas no território português, cfr. Artigo 3º, nº 1 al. d) )

– Acrescentou-se igualmente uma modalidade de investimento que admite a transferência de capitais no valor mínimo de 350 mil euros para a constituição de uma sociedade comercial em Portugal com a criação de 5 postos de trabalho permanentes ou para reforço de capital social de sociedade comercial já constituída com a manutenção ou criação de 5 postos de trabalho permanentes por um período de três anos.

Esta alteração legislativa trouxe também inovações significativas em matéria de autorização de residência com dispensa de visto de residência, ampliando as possibilidades de cidadãos de estados terceiros permanecerem em território nacional sem obrigatoriedade de obtenção do visto de residência competente.

Uma das mais importantes inovações da alteração legislativa foi o acréscimo de uma possibilidade de permanência em território português por um período máximo de um ano para procurar trabalho ou criar uma empresa compatível com a qualificação de quem tenha sido titular de uma autorização de residência por ser estudante de ensino superior ou investigador académico, artigo 122º, nº 1 al. p).

– Decreto Regulamentar nº 9/2018, de 11 de setembro:

De acordo com o Decreto Regulamentar nº 9/2018, o pedido de visto, bem como os documentos necessários, passou a poder ser entregue em formato digital, e, as renovações passaram igualmente a poder ser feitas por via eletrónica.

Ampliou-se igualmente a competência de receção, instrução e decisão das delegações do SEF no que respeita aos pedidos de autorização de residência, por forma a minimizar as consequências de zonas de grande impacto populacional.

Mesmo antes da chegada a Portugal, e em determinados casos, a até agora obrigatória entrevista no consulado de Portugal do país de origem está dispensada, podendo o processo ser todo digital.

Pretendeu -se ainda equilibrar o esforço de agilização dos procedimentos, pelo recurso preferencial à via eletrónica, sem prejuízo da segurança do mesmo, no que concerne à identificação dos requerentes.

Contudo, como é amplamente consabido, a prática deste tipo de procedimentos é muito diferente do que consta do texto normativo, e as dificuldades, se algumas foram mitigadas, muitas mantêm-se inalteradas, com Consulados de Portugal sem condições tecnológicas que permitam a adaptação.

– Lei 28/2019, de 29 de março, que veio estabelecer uma presunção de entrada legal na concessão de autorização de residência para o exercício de atividade profissional

A última alteração à Lei de Entrada, Permanência, Saída e Afastamento de cidadãos estrangeiros de território nacional, vem em suma estabelecer uma presunção de entrada legal em território nacional, para efeitos de concessão de residência para o exercício de atividade profissional.

Na anterior versão da Lei, o seu artigo 88º previa os seguintes requisitos para a concessão de uma autorização de residência para exercício de atividade profissional subordinada:

  1. Possuir um contrato de trabalho ou promessa de contrato de trabalho ou uma relação laboral comprovada por sindicato, por representante de comunidades migrantes com assento no Conselho para as Migrações ou pela Autoridade para as Condições do Trabalho;
  2. Entrada legal em Portugal; e
  3. Inscrição na segurança social, salvo os casos em que o documento apresentado nos termos da alínea a) seja uma promessa de contrato de trabalho.

A grande questão prendia-se, contudo, com o conceito de “entrada legal em Portugal”, que era entendido pelos serviços como sendo apenas a entrada em território nacional por cidadão portador de um visto de residência com a finalidade de exercer atividade profissional subordinada.

Foi para dar resposta à multiplicidade de interpretações sobre a expressão “entrada legal em Portugal” que se operou a alteração à Lei, com a introdução de uma presunção.

A nova redação do artigo 88º, com a introdução do seu nº 6, dispõe o seguinte: “Presume -se a entrada legal prevista na alínea b) do n.º 2 sempre que o requerente trabalhe em território nacional e tenha a sua situação regularizada perante a segurança social há pelo menos 12 meses.”.

O mesmo tendo ocorrido no caso de autorização de residência para o exercício de atividade profissional independente, com a alteração do artigo 89º.

O que a alteração veio permitir foi no fundo a regularização de centenas de milhares de cidadãos que, tendo entrado no território nacional português como turistas, não mais regressaram aos seus países de origem, mas aqui permaneceram, entrando no mercado de trabalho, contribuindo com o pagamento dos impostos e fazendo parte do tecido social de uma forma clandestina.

Obrigada por estar desse lado,

 

Joana Nunes